…era 1984 mas ainda não-Orwell, e na maior cidade do interior do Paraná a gente ainda se sentava à noite no meio-fio, bicicletas encostadas no muro do terreno baldio, embaixo do poste – uma dezena de gurizinhos e meninas da mesma idade – pra contar piada, rir um do outro ou falar ‘sério’ – baixinho e em tom de surpresa e segredo, abismados, os fatos recém-descobertos do mundo adulto. Um tiozinho gordo passava apitando a cada dez minutos, de bicicleta também, e era toda a segurança de que se precisava – nem cercas elétricas, câmeras em circuito fechado, cadeados no portão antes das 23 horas, nem celulares, nada. Às 22, 23 horas começava a ‘chamada’, um a um, e a rua lentamente ia silenciando, até restar só o apito e a luz do poste até o dia seguinte…