Escândalos & fogos de artifício didáticos.

…Pensando aqui nas evidências de como mudamos nossa relação com o poder, o estado e suas estruturas, quando o assunto são as mumunhas e desvios: todos os ‘males’ devidamente expostos e levados à público nos últimos anos (e ‘bora pegar os últimos 25, para uma amostra bem ampla) de nossa democracia representativa (?) sempre existiram, com nomes e beneficiários diferentes. A grande e fundamental diferença é que corriam à boca-miúda, tocada adiante em fala baixa e cheia de reticências, silêncios, ironias. A indignação era a mesma – e correta, a sensação de impotência diante dos fatos idem, ou até maior. Herança de décadas de censura e risco real, físico, brutal. Penso que é uma ilusão a ser perdida urgentemente, a de que houve ‘uma época diferente’ em relação à ocorrência deste tipo de fato; houve é uma época de silêncio forçado e medo.

Damos o tal salto de 25 anos e vemos como esta nossa relação mudou. Escândalos tornam-se espetáculos de mídia pirotécnicos, com auxílio de investigações muitas vezes sérias, mais sérias do que poderíamos supor possíveis. O tal espetáculo, embora desgastado pela repetição (“é escândalo atrás de escândalo”, reclama o público), têm servido para mostrar a distância que há entre nossa ‘representação’ e nossos interesses verdadeiros. Têm colocado à prova a capacidade de esquecimento do brasileiro, obrigando-o a encarar as consequências de seus atos, seu discernimento. Para além da indignação natural com tudo que há de ruim num escândalo que envolva a gestão pública, juro que não consigo achar totalmente ruim que ele seja extra-divulgado e torne-se assunto comum, de boteco até. Há justiça neste espetáculo? Certamente não inteira, e certamente há meias-verdades, interesses ainda piores em jogo, vaidades, mesquinharias, etc; mas me incomodaria mil vezes mais saber dos fatos e suspeitas como estes vinham a 25 anos atrás, sabendo da pouca influência e alcance que teriam dali pra frente.

Nos tornamos acomodados e insensíveis ao rombo da vez, ao Mensalão/inho deste ou daquele partido, ao termo aditivo ad eternum da empreiteira/prestadora/contratada/consultora X, Y ou Z? Talvez. Corremos o risco de acatar como verdadeiros fatos ainda mal-apurados, intencionalmente ou não? Certamente. É o melhor processo de aprendizagem?? Não, porque ainda exibe apenas as peças (totalmente boas ou totalmente más, numa visão maniqueísta tristemente pobre e rasa, mal-hábito nosso, latinos). Não exibe o jogo inteiro, não nos mostra as dimensões do tabuleiro, não nos traz todas as cordas dos marionetes, em especial as mais grossas. Mas é o processo de aprendizagem que temos no momento, e que consegue chegar a todos os cantos, para quem queira ouvir – com menos reticências e mais consequências, agora. 😉

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