Como você vê a Internet ??

Enquanto tanta gente briga por visibilidade na Internet, enquanto empresas investem pequenas fortunas em algo que possa se tornar o novo boom na rede, enquanto profissionais de marketing se enrolam para compreender e usar a nova mídia… outros já entenderam e estão a anos-luz, navegando entre estrelas (e não desviando de icebergs). Antes mesmo do estouro da bolha .com, em plena efervescência de dinheiro fácil para qualquer coisa ligada à internet, um grupo de visionários escreveu o Cluetrain Manifesto, uma provocação em 95 teses que viravam de cabeça para baixo as concepções usuais sobre Internet, mercado eletrônico, consumo on-line, negócios e serviços na rede.

Escrito em linguagem clara (e ferina), o manifesto permanece atual (e ganha força quando analisamos o que funcionou ou não na Internet, desde que ele foi lançado). Está vivo e chutando e, melhor, agora chuta com a força que a certeza traz. Uma pequena parte dele já pode ser vista em serviços como Orkut, Tweeter, Multiply, Del.i.cious; a visão privilegiada do comportamento de indivíduos e mercados no mundo on-line, sua organização, preferências, sua dinâmica – são a diferença entre resultados e fracassos, entre investimento e desperdício, entre imagem e a falta dela. Devia ser leitura obrigatória para qualquer um que pense, sonhe em possuir presença na rede… antes de investir, antes de planejar, antes de contratar qualquer coisa.

Não se trata apenas do como se é visto, ou do que se oferece on-line; o manifesto trata inclusive de seus funcionários (em uma tirada excelente, Firewalls corporativos mantiveram funcionários inteligentes dentro e mercados inteligentes fora” – isso lembra a empresa onde você trabalha?), do modelo de controle e hierarquia (“Comandar e controlar são encaradas com hostilidade pelos trabalhadores intraconectados e geram desconfiança nos mercados interconectados”), e outros assuntos igualmente explosivos e espinhosos.

Outro texto interessante de dois dos autores do Manifesto (Doc Searls e David Weinberger) é o World of Ends (ou mundo de pontas, de finais). Trata novamente de esclarecer, em 10 pontos, o que a internet é – e o que ela, definitivamente, não é. Para quem consegue encontrar a beleza no caráter libertário, anárquico, democrático da rede, é um balão de ar fresco em meio ao calor da fornalha .com.
Em meio à tanta ignorância tecnológica, diante do predomínio de uma certa visão hierarquizada, corporativizante (ei, é uma palavra nova!) e obtusa do que é possuir presença na internet (longe, longe de apenas manter um site), é uma delícia encontrar este tipo de material.

Sam Shepard

Esse é o cara. Ator, roteirista, escritor; lembra “Paris, Texas”, filmaço do alemão Wim Wenders com Harry Dean Stanton e Natassja Kinski? Pois é, roteiro baseado em um conto de Sam Shepard… bateu a curiosidade e acabei lendo os livros de contos dele (Cruzando o Paraíso e O Grande Sonho do Céu). Contos curtos, a maioria momentos de estrada (e a fauna correspondente), gente que se encontra e se perde, pequenas descobertas. Vez ou outra Shepard carrega um pouco (e as vezes muito, perdendo-se) nos personagens, mas é difícil não enxergá-los em carne, osso, dilemas, confusões. Aproveitei o embalo e lí tbem as peças de teatro dele, no mesmo pique e estilo.

Shepard já foi vaqueiro (!), não viaja de avião (!!), e gosta mesmo é de pegar a estrada dirigindo (como ele mesmo diz, “milhares e milhares de quilômetros, até os pés formigarem”). Nunca fui vaqueiro e viajo de avião se precisar (serve bem para trabalho mas para lazer fica devendo algo), mas gostei da parte de dirigir milhares e milhares de quilômetros… eu gosto de estrada, gosto de rodar 600, 700 quilômetros em um dia, fazer parte daquela vida toda alí em volta do asfalto (postos, cidadezinhas, gente), treinar o olho em horizontes, na imensidão (outra constante em Shepard). Pegar a estrada pelo gosto dela, pelo gosto de dirigir até cansar, para limpar a alma em verde (única chance de ascese?).

Dos contos, recomendo de cara “Madilia” (este vou colar um trechinho aqui depois) e o último, acerca de uma filmagem em que Shepard participa como ator (creio que “O Viajante”, um bom filme da mesma época do livro), divertido, ambos em “Cruzando o Paraíso“. Em “Grande Sonho do Céu“, o conto sobre o casal no lago, discutindo o porquê da aversão do marido ao francês, em meio à bagunça dos filhos, é de uma simplicidade e familiaridade tocante.